DEVAGAR (tempo aprox. de leitura: 4 min.)
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Há dezessete anos, quando minha filha nasceu, confirmei a máxima que diz: “Um bebê não vem com manual!” Decidi, por hábito que considero importante na minha vida, procurar “manuais” que me ajudassem, pelo menos, a ser um pai melhor. Encontrei um excelente livro que chamou minha atenção para o tema: SOB PRESSÃO – CRIANÇA NENHUMA MERECE SUPERPAIS – Carl Honoré (Recomendo).
Não conhecia o autor, o jornalista escocês Carl Honoré, autor de um best-seller anterior: DEVAGAR.
Na época, não me interessei pelo tema, o movimento SLOW. Honoré explica que desacelerar tem a ver com qualidade, não com quantidade. “Trata-se de fazer as coisas não o mais rápido possível, mas o melhor possível e, às vezes, a velocidade certa é geralmente menor do que a velocidade que temos hoje”, afirma.
“Quem desacelera também aumenta a sua produtividade: comete menos erros no trabalho, é mais criativo, consegue ver melhor a realidade, ganha perspectiva.”
Impossível para mim não associar (inferir) essas considerações aos anos de prática no Iaido e Aikido. Escutei literalmente milhares de vezes meu mestre, Sensei Antônio, proferir no treino de Iaido: “Devagar! A velocidade vem com o tempo, naturalmente!”
Lembro-me de um encontro com um mestre japonês convidado que, percebendo o ímpeto e a velocidade de alguns aikidocas faixas pretas, interrompeu o treino e pediu a todos que cantarolassem uma valsa, chamando os “apressados” ao ataque. Sem alterar seu ritmo, no compasso da valsa, derrubou-os graciosamente; inexplicavelmente.
ISOGABA MAWARE (Kotowaza (provérbio japonês): “Mais pressa, menos velocidade”)
Todas essas considerações vieram-me à mente, assistindo recentemente um documentário sobre uma lenda da natação australiana e mundial: Ian Thorpe, o Torpedo.
Aos 15 anos, Ian Thorpe já era campeão mundial. Com 17, o Torpedo se transformou no principal nome do esporte australiano nas Olimpíadas de Sydney (2000). Ao todo, faturou nove medalhas olímpicas, das quais cinco foram de ouro, bateu 13 recordes e ganhou 11 títulos mundiais.
O que me chamou muita atenção nesse vídeo foi a explanação sobre a técnica revolucionária de Thorpe.
Na prova dos 400 metros, Ian Thorpe nadou com um estilo mais lento, onde no momento de respirar deixava o braço contrário estirado, dando a impressão de um deslize pela água, como se fosse um patinador no gelo.
Para se ter uma ideia, Thorpe foi 3 segundos mais rápido do que o segundo colocado, dando 88 braçadas a menos (232 braçadas contra 320).
Como não poderia deixar de citar meu filósofo preferido, Sêneca, em “Sobre a Brevidade da Vida”, descreve com preocupação os apressados e os ocupados, que me causa espanto a contemporaneidade. Consigo ver ele descrevendo um executivo moderno, andando apressado, com sua pasta e celular no ouvido, sem domínio do tempo para fazer suas atividades, sem tempo para seus relacionamentos, sem tempo para viver. Há 2.000 anos!
“Investiguemos de que modo a alma deverá prosseguir sempre de modo igual e no mesmo ritmo. Ou seja, estar em paz consigo mesmo, e que essa alegria não se interrompa, mas permaneça em estado plácido, sem elevar-se, sem abater-se. A isso eu chamo tranquilidade. Investiguemos como alcançá-la.” (“Da tranquilidade da alma” – Sêneca)
Honoré, Antônio, Thorpe, Sêneca. Não me faltaram exemplos para aprender a lidar com o paradoxo do tempo.
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Leonardo Seixas (Diretor de Marketing)