MANUAL DO PILOTO MORTO (tempo aprox. de leitura: 3,5 min.)
.
Depois de algum tempo, já atuando como Imediato de um Full Container há anos, fui visitar meu estimado e saudoso ex Comandante do NHi Orion, Almirante Ortiz, quando ele trabalhava na DPC (Diretoria de Portos e Costas). Por várias vezes visitei-o lá, botando a conversa em dia, matando a saudade e trocando ideias e experiências. Falávamos muito sobre as diferenças entre a Marinha de Guerra e a Marinha Mercante; trabalhos totalmente distintos, tendo em comum apenas o “instrumento de trabalho”: um navio.
Nesse encontro em particular, ele me mostrou que muitos Oficiais da Reserva estavam fazendo requerimento para dispensa do estágio embarcado após a conclusão do curso necessário (antigo ATSN, atual ATNO), fins se certificarem como Capitães de Longo Curso. Perguntou-me o que eu achava desse estágio embarcado e sua real necessidade.
Nesse momento, transportei-me no tempo e me vi no camarote do meu cunhado, Chefe de Máquinas do navio em que estava estagiando. Tenso, perguntava-lhe coisas óbvias que havia anotado sobre as funções dos tripulantes num navio mercante, suas rotinas e atribuições. Disse-lhe que estava preocupado com meu desconhecimento sobre muitas coisas de um navio mercante, o que ele me respondeu: “Fica tranquilo! Sei de sua capacidade e, se aqui fosse difícil, só teria cientista da NASA.”
Voltando ao momento com o Almirante Ortiz, respondi-lhe que achava o estágio embarcado extremamente importante e indispensável para quem pensa seriamente em desempenhar uma função embarcado. Uma aproximação da realidade de bordo, que nenhum curso teórico capacitaria.
Essa é, para mim, uma visão muito clara da importância de um estágio, na Marinha Mercante ou em qualquer profissão, seja para os “normais” como eu ou para os com mentes privilegiadas; os “cientistas da NASA”. Isso sem levar em conta a natural sonegação de informação e experiência dos que, por diversos fatores nada dignificantes, “escondem o bolinho”.
Em oposição aos que “escondem o bolinho”, decidi sempre me esforçar em deixar um legado por onde passei, criando guias práticos ou registros de rotinas de trabalho acessíveis aos que me sucederiam nas funções que exerci. A esses guias práticos, apelidei-os de “Manuais do Piloto Morto”.
Explico: imaginem estarem num avião que percebem a ausência de controle porque o piloto morreu. Na cabine, você encontra uns livros grossos, os manuais de pilotagem daquele avião. Ao lado deles, uma apostila fina, manuscrita, intitulada Guia Rápido de Pouso. Não tenho dúvida qual recurso utilizaria para tentar sobreviver.
Cabe aqui ressaltar que nunca desprezei o estudo nos “livros grossos”. Até porque são através deles que, aliados à prática, somos capazes de compilar um “Manual do Piloto Morto”.
Descobri, claro, que não estou sozinho nessa forma de pensar e agir. Descobri, há menos de um ano, que poderia participar de um projeto que atenderia, justamente, em dar continuidade à minha visão de contribuir com meios para tornar a vida dos que nos sucedem na vida naval e portuária menos dificultosa. Amenizar a falta de conhecimento e prática, indicar cursos que diferenciem um profissional, fornecer mais “Manuais do Piloto Morto” e superar as barreiras impostas dos que “escondem o bolinho”.
Pena não poder mais me encontrar com meu amado líder, Almirante Ortiz, e contar-lhe, como eu planejava, minha participação no Instituto Mar Futuro.
.
Leonardo Seixas (Diretor de Marketing)