ÚLTIMA MISSÃO (tempo aprox. de leitura: 3 min.)
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Eu me lembro do mês e do ano de minha última missão antes de me desvincular totalmente da Marinha. Muitos contestarão a veracidade dessa frase porque, até hoje, mantenho vínculos impossíveis de serem apagados da minha alma marinheira, mas guardo uma efeméride como referência do fim de minha atuação na Marinha de Guerra: 12 de outubro de 1992, dia da queda do helicóptero em que estava o deputado Ulysses Guimarães.
Naquela semana, já oficialmente “de pijama”, retornei ao meu antigo navio, o Navio Hidrográfico Orion, para ajudar voluntariamente no adestramento do recém instalado Sistema Racal 900, o primeiro sistema eletrônico de sondagem hidrográfica da Marinha.
Estava já me despedindo dos companheiros quando recebi a notícia de que o Orion fora designado para realizar as buscas do helicóptero naufragado. A tripulação não seria licenciada e deveria pedir aos seus parentes que trouxessem pertences para bordo.
Já no cais, fui surpreendido pelo pedido de acompanhar as buscas, auxiliando como “supervisor técnico” na operação de varredura do Side Scan Sonar. Respondi que iria responder ao pedido quando chegasse em casa e consultasse minha “superior hierárquica”. Ao sair do banho para “clarear” minha decisão, deparei com minha mala já pronta, sinal de que “minha” decisão já estava tomada.
Retornei ao Orion e imediatamente começamos a tentar planejar nossa busca, com as escassas informações que tínhamos. Partimos numa missão com a sensação de que as chances de sucesso não estavam do nosso lado.
Essas lembranças foram despertadas para mim porque surgiram, durante uma reunião, a alusão da extinta figura dos “telecos”, os telegrafistas de bordo.
A caminho do nosso ponto inicial de busca, o Comandante me chamou para a Estação Rádio porque havia recebido mensagens da DHN pedindo esclarecimentos urgentes de minha parte.
Uma famosa estação de televisão queria me entrevistar (a bordo!) e a DHN gostaria de saber, antecipadamente, as informações que eu passaria na entrevista.
Lembro-me da descrição dos detalhes da operação do Side Scan Sonar que pedi para o teleco transmitir: “Almirante, pegue uma folha A4 “deitada” e suponha ser parte do rolo de registro do Side Scan Sonar; desenhe uma mancha do tamanho de um grão de arroz; é isso o que estaremos procurando como registro do helicóptero naufragado, supondo que a cauda não tenha se partido na queda; acrescente a possibilidade de enterramento no fundo, por sabermos das condições de fortes correntes causadas pelo mau tempo que contribuiu para o acidente; por último, não podemos estimar o tempo gasto na busca devido à incerteza do ponto inicial de busca e tamanho da área a ser rastreada.”
Com essa mensagem, claro que a entrevista não foi liberada.
Há trinta anos, perdi, conscientemente, meus “cinco minutos de fama”.
Há trinta anos, ninguém localizou os restos do helicóptero, nem do deputado Ulysses Guimarães.
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Leonardo Seixas (Diretor de Marketing)